A Autocrítica necessária

Antônio Assis
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Marivaldo Pereira e Rogério da Veiga*

A resistência dos grandes partidos em ouvir a população e reconhecer seus erros é uma das grandes responsáveis pelo resultado trágico que obtiveram nas eleições deste ano.

Considerando-se a votação obtida pelos eleitos para a Câmara dos Deputados, apenas dois dos 10 partidos mais votados nas eleições de 2014 conseguiram aumentar sua votação — e mesmo assim numa proporção bastante pequena, de pouco mais de 6%. Todos os demais partidos tiveram queda em suas votações. Alguns deles perderam mais de 60% da votação obtida em 2014 — como foi o caso do PSDB, do MDB e do PTB.

Para se ter uma ideia do montante dessa perda, o PSDB sozinho perdeu quase 4,9 milhões de votos, enquanto o MDB perdeu 4,4 milhões de votos, figurando como as primeira e segunda legendas, respectivamente, com a maior perda de votos. O PT, segundo mais votado em 2014, perdeu 1,1 milhões de votos.[1] A queda na votação desses partidos ocorreu mesmo diante de regras que os favoreceram na disputa deste ano, como a da distribuição dos recursos do Fundo Eleitoral e do tempo de TV para o programa eleitoral.

Os votos migraram para o PSL de Bolsonaro, que herdou quase 7,5 milhões de votos e que, apesar de ter disputado as eleições em 2014, apareceu para o eleitor como uma “novidade”, impulsionada pela popularidade de seu candidato à Presidência. Outros 4 milhões de votos migraram para novas legendas, como o Podemos, o Novo, o Avante e o Patriota. Há ainda outra grande parte que migrou para brancos e nulos e para partidos que conseguiram ampliar seus votos nessas eleições, com destaque para o PSOL, que dobrou sua votação.[2]

Inúmeros fatores podem ser apontados para justificar a forte migração de votos verificada nestas eleições, mas sem dúvida alguma a falta de resposta dos grandes partidos às acusações que vieram à tona com as operações de combate à corrupção realizadas nos últimos anos foi determinante para isso.

A Operação Lava Jato, por exemplo, alcançou parlamentares e dirigentes de pelo menos 14 partidos. Entre as ilegalidades investigadas, estava a acusação de desvio de dinheiro para o financiamento de campanhas partidárias ou mesmo para o benefício próprio de parlamentares.

Vários fatos demonstram que parte das ações empreendidas no âmbito dessas operações foi impulsionada por interesses políticos. Apesar disso, é indiscutível que muitos dirigentes e parlamentares das legendas que dominam o cenário político nacional violaram a lei. Independentemente do mérito, a alegação de perseguição política por parte do sistema de justiça mostrou-se insuficiente para promover a reconciliação desses partidos com a sociedade.

Os partidos perderam credibilidade perante a população. A população assistiu a sucessivos escândalos, operações, prisões, malas de dinheiro, apartamentos com milhões, devoluções milionárias de recursos desviados sem qualquer reação dos partidos no sentido de mostrar que estavam tomando medidas internas para investigar e punir seus membros eventualmente envolvidos nesses escândalos e sinalizar para a sociedade que também estão preocupados com o problema da corrupção.

A verdade é que a maioria dos partidos ainda não possui estruturas e mecanismos que assegurem a transparência da atuação de seus dirigentes e parlamentares, tampouco que permitam a punição daqueles que se envolverem em escândalos.

Sem prejuízo de apontar as ilegalidades e abusos eventualmente cometidos pelo sistema de justiça, seria fundamental que os partidos adotassem medidas para evitar desvios de seus dirigentes e parlamentares, mostrando à sociedade que a ética e o combate à corrupção também estão entre suas preocupações.

Nesse sentido, medidas que aumentem a transparência e a participação na gestão interna, que instituam comissões de ética independentes das forças internas e que permitam acompanhar a evolução patrimonial de seus dirigentes seriam fundamentais para resgatar a credibilidade dos partidos perante a sociedade. Enfim, medidas que obriguem seus integrantes a prestarem contas ao partido político, permitindo a este prestar contas à sociedade.

Mais do que necessárias, a adoção de medidas que alterem radicalmente seu modo de funcionamento são fundamentais para que os partidos voltem a fortalecer sua militância e recuperem sua capacidade de diálogo e debate com a sociedade, interrompendo a ascensão de um extremismo que coloca em risco não apenas a continuidade da existência dos partidos, mas também da própria democracia.

*Rogério da Veiga é especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, trabalhou com ações para o desenvolvimento da primeira infância no Ministério do Desenvolvimento Social e na Prefeitura de São Paulo.

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