Lava-Jato é uma voz pregando no deserto, diz Sérgio Moro

Antônio Assis
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Juiz Sergio Moro participa do IX Fórum da Associação Nacional de Editores de Revistas - Marcos Alves / Agência O Globo

SÃO PAULO - Responsável pela condução da Operação Lava-Jato em primeira instância, o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, disse nesta segunda-feira estar “decepcionado” com a falta de respostas institucionais do Congresso Nacional e do governo federal para os problemas decorrentes da corrupção no país, apesar do impacto das revelações da Lava-Jato e das manifestações contra corrupção ocorridas no início do ano. A afirmativa foi feita durante palestra do juiz no IX Fórum da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), realizado em São Paulo.

O processo (da Lava-Jato) tem ido bem, mas não posso assegurar o dia de amanhã. Do ponto de vista de iniciativas mais gerais contra a corrupção, existe um deserto. Parece que a operação Lava-Jato, nessa perspectiva, é uma voz pregando no deserto — disse o juiz, que desde o início do ano defende, em parceria com a Associação de Juízes Federais (Ajufe), uma série de reformas legislativas para diminuir a impunidade e melhorar procedimentos de combate à corrupção no país.

Para Moro, só as reformas necessárias permitirão que investigações como a Lava-Jato não sejam tratados como “casos extraordinários”, mas “de maneira ordinária nas cortes de Justiça”.

— Não vai ser a Lava-Jato que vai resolver os problemas da corrupção no Brasil, não vou ser eu, não foi a Ação Penal 470 (conhecida como ação do mensalão); é o que nós, como cidadãos, vamos fazer a partir de agora. E para isso precisamos ter uma melhora nas nossas instituições e eu, sinceramente, não vejo isso acontecendo de maneira nenhuma — lamentou.

Moro lembrou que no início do ano o governo lançou projetos “interessantes, ainda que tímidos” de combate à corrupção, quando se encontrava em “quadro político delicado”.

Nunca mais ouvi falar — criticou o juiz.

LEI DO DIREITO DE RESPOSTA

Responsável por conduzir uma entrevista com Moro logo após sua palestra, o presidente da Aner e diretor-geral da Editora Globo e Infoglobo, Frederic Kachar, perguntou sua opinião sobre a nova lei de direito de resposta, sancionada recentemente pela presidente Dilma Rousseff.

Para o juiz, embora o direito de resposta “não seja um problema em si, na medida em que ele amplia o debate”, é preciso tomar cuidado para que ele seja assegurado sem virar mecanismo de censura.

Pode até ter havido boas intenções na formatação (da lei), mas além de problemas procedimentais de defesa da imprensa, ela ficou um pouco vaga demais — criticou o juiz, para quem a definição de “ofendido” na lei deveria ter sido acompanhada pelo estabelecimento de hipóteses de exercício do direito.

(Ela serve) para o ofendido em quaisquer circunstâncias? Mesmo se o fato for verídico? Mesmo se o fato for informado com base em informações com razoável cuidado por parte do órgão de imprensa? — perguntou o juiz.

Para Moro, embora fosse desejável que se tivesse uma lei mais “precisa”, é possível que na interpretação e aplicação da lei por parte dos juízes se possa ter uma “devida delimitação acerca do alcance dela”.

Geralmente criticado por manter presos acusados de corrupção que ainda não tiveram a sentença transitada em julgado, o juiz defendeu o uso da prisão cautelar em caráter excepcional e “com a presença de amplo quadro probatório”, como mecanismo de frear a “corrupção sistêmica” no país. Ele lembrou o caso de investigados flagrados praticando crimes de corrupção na Petrobras em meio às investigações sobre a estatal.

Durante o evento, Moro também reclamou da falta de atenção ao Projeto de Lei 402/2015, em tramitação no Senado, que tinha como intuito diminuir a lentidão do poder judiciário, que estaria sofrendo “obstrução por parte do Congresso”.

Será que tudo isso que foi revelado, milhões de pessoas saindo às ruas, será que não é suficiente para que se faça alguma coisa? Ou será que a única preocupação é com a própria sobrevivência? — questionou.

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