Brasileiros passam o Dia do Trabalho desempregados

Antônio Assis
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Marina Barbosa
Folha-PE

Há pouco, o 1º de Maio era motivo de comemoração para Leonildo Oliveira. No Dia do Trabalho deste ano, no entanto, o profissional de 26 anos não tem o que celebrar. Pela primeira vez, Leonildo vai passar a data sem carteira assinada. Foi demitido há três meses, mesmo com uma graduação em logística e o currículo experiente, pois a distribuidora em que trabalhava não resistiu à crise econômica.
É o retrato de milhares de brasileiros que perderam o emprego nos últimos meses por causa da recessão que fechou vagas, lojas e indústrias em todo o País. “Não há o que comemorar neste 1º de Maio. E provavelmente também não haverá no próximo, porque o desemprego tem crescido de maneira acentuada em todos os setores da economia, com exceção do agronegócio. Somado à inflação crescente, ainda tem caído de forma significativa o rendimento médio real do trabalhador. Muitos dos que tinham relações de trabalho formais estão migrando para o mercado informal, cujos empregos são mais precários”, lamentou o professor Carlos Magno, do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco, que lembrou que a taxa de desocupação chegou aos dois dígitos em fevereiro.
O índice marcou 10,2% segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e passou para 10,9% em março, elevando para mais de onze milhões o total de desempregados no País. “É quase a metade do total de empregados de toda a Europa. Um de cada três novos desempregados do mundo é brasileiro. Nos últimos 12 meses, uma média de 8,2 mil pessoas caíram no desemprego por dia no Brasil”, revelou Paulo Canoa, CEO da unidade de recrutamento e seleção do Gi Group no Brasil.

“Quando me formei, não faltava emprego. Fui de operador de máquina a supervisor de logística em seis anos. E ainda esperava mais, porque as empresas não paravam de chegar e contratar. Mas a crise veio e mudou tudo. As fábricas passaram a fechar e demitir. Eu, por exemplo, tive a função excluída para enxugamento de quadro. Depois, fui demitido porque uma loja fechou. Foi há seis meses. Até agora não consegui nada”, contou Leonildo, que saiu de Vitória de Santo Antão para buscar um emprego na Capital. No Recife, porém, também não teve sorte. “Está difícil em todo canto”, disse ele, que hoje vende salada de frutas e água no Centro.
Luta
“Temos que fazer algo informal, porque não está aparecendo nada com carteira assinada”, concordou Karine Alves, de 26 anos. Ela estuda administração e é técnica em enfermagem, mas foi demitida há seis meses porque o fluxo de pacientes na clínica em que trabalhava despencou com a crise. Desde então, não encontrou uma outra oportunidade de trabalho fixo, nem em áreas de rendimento e exigência menor.
A tática também não deu certo para Ronaldo Ribeiro, 37. Ele era pedreiro; mas, com a queda da construção civil, passou a atuar como auxiliar de serviços gerais no ano passado. “Era uma profissão que, apesar de ter um salário menor, me dava estabilidade, porque não previa uma demissão no curto prazo”, contou.
Com o agravamento da crise, contudo, não deu para segurar nem essa vaga de servente. “Não temos mais perspectiva de trabalho nem motivos para comemorar o 1º de Maio”, disse, apoiado por Karine, que desabafou: “Não há nada a celebrar no âmbito do emprego. Se for para comemorar, só a saúde mesmo, porque é ela que nos permite continuar na luta por um trabalho”.
Arthur Mota/Folha de Pernambuco
Ronaldo Ribeiro perdeu o emprego na semana passada
“É muita gente para pouco emprego”

Na mesma semana, Ronaldo Ribeiro perdeu emprego e descobriu que a esposa também pode ser demitida em mais um enxugamento de quadro. Não bastasse isso, ao dar entrada no seguro-desemprego, ainda foi pego de surpresa com a multidão à procura de uma vaga na Agência do Trabalho do Recife.
Por dia, já são ao menos 500 pessoas em busca de um emprego no prédio da Rua da Aurora. O movimento é igualmente elevado nas outras 28 agências pernambucanas e também bate recordes nos bancos de currículos virtuais. Só o Banco Nacional de Emprego recebe 15 mil novos candidatos por dia.
“O desemprego está alto. São 11 milhões de desocupados no País e grande parte deles está em Pernambuco. Afinal, fora os efeitos da crise, o Estado sofreu com o fechamento de Suape. E, quanto mais o desemprego sobe, mais a procura aumenta”, explicou a coordenadora das Agências do Trabalho de Pernambuco, Tereza Farias, lembrando que a alta só não chegou ao número de vagas. “Enquanto a procura aumentou 15%, a oferta diminuiu 30% desde o ano passado”, revelou, contando que hoje só são abertas 30 ou 40 vagas por dia. Há três anos, eram ao menos 300.
“O nível de vagas está abaixo da demanda”, concordou Josiane Butenas, do BNE, que registrou um aumento 59% do número de currículos e uma redução de 45,3% no quadro de vagas. “É muita gente para pouco emprego”, lamentou Ronaldo.
É por conta desta desproporção que o professor Carlos Magno, da UFPE, não acredita que o mercado de trabalho vá mudar no curto prazo. “Na melhor das hipóteses, o Brasil vai ter um leve crescimento só em 2017”, explicou.
Empresas buscam “mais por menos”
Não foi só a concorrência por uma vaga que cresceu. Para aproveitar o melhor dos trabalhadores, as empresas decidiram exigir mais de seu pessoal. Os empregados, por sua vez, passaram a aceitar salários menores e até cargos aquém de sua qualificação.
E os que mantiveram o trabalho aceitaram acumular funções para não correr riscos. O resultado é a precarização do trabalho formal. “Neste momento, o número de contatos e entrevistas para conseguir um emprego pode ser o dobro ou mesmo o triplo de 5 anos atrás. Afinal, com o forte aumento de candidatos disponíveis, os critérios de seleção estão mais exigentes”, reconheceu Paulo Canoa, CEO do Gi Group. “As empresas exigem demais e pagam pouco. Os salários mal dão conta das despesas. E assim é impossível se qualificar para tentar algo melhor”, desabafou Ronaldo Ribeiro.
Segundo a Pnad, o rendimento médio do trabalhador recuou 3,2% no primeiro trimestre deste ano comparado com o mesmo período de 2015. “Isso é ruim. O trabalhador perde poder de compra”, alertou a economista Tânia Bacelar, dizendo que os trabalhadores já não têm poder de barganha na negociação salarial porque têm medo do desemprego e as empresas também não estão bem financeiramente. “Até 2014, cerca de 80% das categorias recebiam reajustes salariais acima da inflação. Hoje, é o contrário. A maioria das categorias não recebe reajustes capazes de compensar a inflação”, acrescentou o professor Carlos Magno.
“Muitos profissionais que tinham salários altos estão buscando oportunidades com rendimentos inferiores para não ficarem desempregados”, explicou Josiane Butenas. “Tem quem chegue querendo qualquer coisa”, completou Tereza Farias. “A redução salarial pode facilitar o retorno, mas é preciso atender ao perfil que a empresa procura. As empresas sabem que muita mão de obra qualificada está desempregada”, analisou.

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