Puxadinhos, alternativa de moradia

Antônio Assis
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Carolina Leão
Folha-PE

Toda época tem um tipo de moradia que revela o quadro social e cultural por trás de uma arquitetura. No Nordeste, a suntuosa casa grande da colonização foi possível devido à transferência de famílias inteiras para o novo continente. Casarões com vários cômodos e áreas livres suficientes para unir a família àeconomia açucareira. Hoje, Recife revela em sua periferia, e aos poucos também nos bairros de classe média, uma alternativa para o direito à moradia. Os famosos puxadinhos foram a saída encontrada por muitas famílias para fugir do preço do aluguel ou, ainda, das burocracias para o acesso à casa própria. O famoso jeitinho brasileiro também na hora de construir.
A escolha revela dois fenômenos contemporâneos. Por um lado, as facilidades de crédito, com a possibilidade de parcelar material de construção permitindo muita gente reformar sua casa, construindolajes, garagens ou novos ambientes para seus membros constituir novas famílias. Por outro, crise política na habitação popular redefinindo o conceito de convivência em família. Se nas décadas passadas, os jovens eram estimulados a poupar para conseguir a tão sonhada casa própria, agora enfrentam novos desafios, gerenciar a administração de um lar dividido entre irmãos, sogros e filhos.

Especialista em habitação popular, o professor Luís de La Mora, da UFPE, aponta o principal motivo que leva famílias jovens a optar por morar no mesmo local dos pais é o altíssimo valor dos terrenos na zona urbana do Grande Recife, além de uma política pública de habitação popular ineficiente. Mesmo nas áreas de morros e córregos, o valor é alto. “Os créditos formalmente existem. A Caixa tem programas definanciamento com juros muito baixos, subsidiados, e mesmo sem juro, mas a complexidade burocrática é tão grande que dificulta o acesso a estes recursos por parte dessas famílias”, destaca.
Como as de Tiago Carneiro, educador social. Casado há 10 anos, ele se livrou do aluguel de R$ 200, nos Coelhos, ao optar por morar com o sogro, num terreno construído abaixo da casa do Seu Francisco, pai também de João Paulo e de mais dois filhos que moram juntos, numa casa em Beberibe. Embaixo, Tiago vive num pequeno cômodo com a esposa e Yasmim, a filha de cinco anos. Atrás, João Paulo e a irmã dividem outro compartimento do terreno. As contas de luz e água vêm separadas, o que permite liberdade para que cada uma das três famílias existentes num mesmo lote possam administrar suas finanças. “No futuro, penso em sair daqui. Mas por enquanto não dá. Ganho R$ 1.110 e só de aluguel gastaria, no mínimo, R$ 600”, coloca.
Situação semelhante vive a corretora autônoma Ana Pimentel. Há 10 anos, recém-separada, não conseguiu dar conta das dívidas acumuladas com aluguel e voltou para a casa da mãe, em Campo Grande, onde já morava uma família, no primeiro andar da casa. Atrás da residência da mãe, Ana construiu cozinha, banheiro e dois quartos. “No início foi difícil a adaptação. Cheguei a passar anos sem falar com uma irmã. Mas aqui posso dar uma vida melhor para os meus filhos”.

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