Os 20 anos de “Da Lama aos Caos”

Antônio Assis
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Em janeiro de 1994, a gravação de “Da Lama aos Caos” foi concluída. Segundo Renato L, produtor cultural e amigo pessoal da banda “pré, durante e pós-mangue beat” como gosta de se referir, Chico Science e a Nação Zumbi tiveram alguns percalços antes de ver o produto final: “Naquela época do Brasil, além dos meninos não terem experiência de estúdio, os locais brasileiros tinham dificuldade para gravar sons graves, o que complicava registrar os sons de tambores, tão fundamental para a Nação Zumbi”, revela.
Chico e Fred, quase irmãos. Foto: Divulgação
Chico e Fred, quase irmãos. Foto: Divulgação
Fred Zero Quatro, líder do Mundo Livre S/A e parceiro musical e da vida de Chico Science, também colocou que tudo foi muito intenso e rápido: “Chico e a Nação foram para o estúdio, mas o repertório não estava pronto. Muita coisa surgiu durante a gravação de Da Lama Ao Caos”, registra. Apesar de não ter acompanhado a gravação da banda do amigo, Science fez questão de usar composições de Zero Quatro. E mesmo que nos créditos do disco Fred apareça assinando duas canções, ele garante que foram apenas “uma música e meia”. E justifica: “Mesmo que eu apareça como um dos compositores de ‘Rios, Pontes e Overdrives’, eu só colaborei com duas frases que se tornaram o refrão da canção.Rios, pontes e overdrives / Impressionantes esculturas de lama. São dois títulos de músicas minhas, que quando Chico viu, disse que queria gravá-las algum dia e, na hora de fechar a música, ele resolveu me colocar como co-autor dessa parada”, dispara.
Essa adrenalina de compor boa parte do disco às pressas contrasta com outras músicas que já chegaram praticamente prontas no estúdio ou receberem pequenas modificações: “Boa parte daquelas canções eu vi crescer nos shows, com outros arranjos”, explica Renato L.
Renato L também fez parte do movimento. Foto: Felipe RIbeiro/JC Imagem
Renato L também fez parte do movimento. Foto: Felipe RIbeiro/JC Imagem
Se gravar um disco é complicado, imprimir a sua identidade nele pode ser mais difícil ainda. A capa e o projeto gráfico de Da Lama Ao Caos – assinado por Dolores (Helder) & Morales (Hilton Lacerda) – por incrível que pareça, foi um capítulo à parte antes do trabalho chegar nas lojas. É o que garante o jornalista e fotógrafo Fred Jordão, que ficou responsável pela fotografia desse disco antológico: “O disco era pra ser todo sépia. A capa era toda marrom com um caranguejo estilizado, recortado, feito em xérox de vários tamanhos, como se fosse um quebra-cabeça. Renato (L) arrumou a corda de caranguejos pro estúdio. O problema é que os caranguejos saíam pela casa, desapareciam”, relembra ele aos risos.
A capa do CD "Da Lama ao Caos"
A capa do CD “Da Lama ao Caos”
Embora a sonoridade e os ideais daquelas 14 faixas estivessem bem definidas e prontas para revolucionar, parece que a Sony Music não acompanhou bem o ritmo de Chico Science & Nação Zumbi no início. Os executivos queriam uma capa “colorida”, já que tambores e sotaque nordestino não lembrava outra coisa que não fosse o axé music. E mesmo cedendo para um caranguejo multicolorido na capa e um lado colorido no encarte, a coisa não saiu bem ao gosto do grupo: “A gravadora sacaneou, por economia mesmo. Os caras não tinham a menor ideia do que tinha na mão, do trabalho que tinha dado e do que iria ser aquele disco”, desabafa Fred Jordão.
Além dos 50 minutos de áudio do disco “Da Lama Ao Caos”, os quadrinhos escritos por Hilton Lacerda com as ilustrações de Helder, e o manifesto “Caranguejos com Cérebro”, assinado por Fred Zero Quatro, no encarte, completam a riqueza deste álbum carregado de ideologia e um som que anunciava: o Manguebeat estava chegando para ficar.

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