RECEITA DE MÃE

Antônio Assis
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Muito boa, antológica, a entrevista que o papa Francisco concedeu ao Gerson Camarotti, merecedora de um prêmio especial por vários motivos, pelo entrevistado e pelo entrevistador.
Há 2.000 anos, são raríssimas as entrevistas pessoais com os chefes da Igreja Católica. Não havia veículos de transmissão e, quando surgiram jornais, revistas, rádio e TV, continuaram raríssimas. Para falar a verdade, só me lembro de três.
Viajei com João Paulo 2º duas vezes. Bati papo com ele, mas não foi uma entrevista. Ele contou que havia aprendido a dizer em português "aquele abraço". Perguntou se colava mal repetir a saudação em seus pronunciamentos oficiais. Não me deu conselho algum, mas o pediu a um pecador, agnóstico profissional.

Papa Francisco respondeu com sinceridade e coragem a todas as perguntas do Gerson. Na edição da entrevista, houve inserções dos seus pronunciamentos públicos, inclusive o que me pareceu mais veemente, quando exigiu que os jovens continuassem a protestar em todo o mundo contra uma sociedade injusta e violenta. Chegou a dizer, em público e na entrevista pessoal, que o jovem calado não é do seu agrado.
Reconheceu os pecados da igreja, ele próprio se admitiu pecador. Não será fácil reformar a Cúria Romana, poderá até se tornar trágico --já houve precedentes ao longo da história.
A sua primeira visita internacional foi mais do que um sucesso. Ele chegou a pedir desculpa ao prefeito do Rio pela "bagunça" que provocou na cidade. A culpa não foi dele, mas das autoridades locais, que se mostraram incompetentes para enfrentar um evento de nível mundial.
A palavra que Francisco mais falou na entrevista foi "proximidade". A mãe que segura o filho no colo e fala com ele no peito, e não por meio de cartas e homilias. Valeu.

Fonte: Folha de S.Paulo



BOM, MAS TEM DE MELHORAR

O IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) confirma que o Brasil, mesmo que aos trancos e barrancos, vai no bom caminho. E que, apesar das críticas e da guerra cruenta entre PSDB e PT, foi sob o comando do sociólogo Fernando Henrique Cardoso e do grande líder de massas Luiz Inácio Lula da Silva que o país efetivamente deu seu grande salto.
A pesquisa mostra que o IDH do Brasil melhorou 47,5% em duas décadas e saiu de "muito baixo" para "alto". Em 1991, 85,8% dos municípios brasileiros tinham um IDH "muito baixo". Em 2010, era apenas 0,6%.
O maior salto é no Norte/Nordeste, mas o Sul/Sudeste continua na dianteira. O DF fica em primeiro lugar, mas, como é "hors-concours" por ser muito peculiar, cede lugar a São Paulo, ou seja, à "locomotiva" do Brasil. De onde, aliás, o carioca Fernando Henrique e o pernambucano Lula saíram para o Planalto e para mudar a cara do país.
Um porque combateu a inflação, elevou o patamar internacional do país, botou a casa em ordem na economia e deu o "start" em programas sociais cruciais. O outro porque manteve uma política macroeconômica saudável e transformou o grande momento mundial em oportunidade para uma inclusão social histórica.
Caminhando ao lado dos dois regimes --um continuação do outro--, estávamos a população em geral, a academia, a indústria, o agronegócio e a imprensa independente cobrando, provocando, apontando erros e exigindo sempre mais. Assim se constrói um país melhor. Assim se consolida a cidadania. E daí 1 milhão de pessoas vão às ruas botando o dedo nas feridas e na cara dos governantes de todos os níveis.
Há muito ainda a fazer, principalmente na educação. O último lugar em desenvolvimento humano foi Melgaço (PA), onde metade da população não sabe ler nem escrever. Enquanto houver "Melgaços" no Brasil, gritemos. Oba-oba os governantes já fazem à exaustão.

Fonte: Folha de S.Paulo




REMANSO PARA DILMA

E prefeitos tiveram suas taxas de popularidade avariadas pelos protestos de junho, como mostrou a pesquisa Datafolha do final do mês passado.
Agora, dois outros levantamentos divulgados nesta semana mostram um grau de deterioração similar. No caso de Dilma Rousseff, as pesquisas da CNT e do Ibope indicam que a petista parece ter estacionado no patamar de 30% das intenções de votos na disputa pelo Planalto em 2014.
A primeira pesquisa a detectar a grande queda de Dilma foi a do Datafolha, cujos dados começaram a ser coletados em 27 de junho. Os levantamentos seguintes foram realizados de 7 a 10 deste mês (CNT) e de 11 a 14 (Ibope). Embora com metodologias diferentes, os três estudos colocam a atual presidente na mesma faixa dos 30% nos cenários mais prováveis da corrida sucessória.
Tudo indica que se formou um remanso para Dilma Rousseff. Ela parou de cair. Não há dados conhecidos para todos os governadores e prefeitos, mas o mais provável é que o remanso seja quase geral. Os brasileiros estavam irritados. Foram às ruas e protestaram. Desidrataram o nível de confiança que depositavam nos políticos. Agora, vão esperar um pouco para ver o que acontece.
Para Dilma, a notícia é boa e ruim ao mesmo tempo. A parte positiva é ter estancado a sua queda. A negativa é que está perigosamente estacionada numa faixa em que pode ser superada pela soma das intenções de voto dos demais adversários.
A oposição emerge ainda frágil e com um sinal amarelo para candidatos do establishment como Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Até porque, quem mais se beneficiou até agora da derrapada de Dilma foi um nome da terceira via, a verde Marina Silva e sua Rede.
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E nesse remanso, entro duas semanas em férias. Até a volta.

Fonte: Folha de S.Paulo 


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