Bebês prematuros: pequenos milagres

Antônio Assis
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Prematuridade é um dos desafios no combate a mortalidade infantil no BrasilFoto: Arthur Mota

Renata Coutinho
Folha de Pernambuco

A pequena Maria Eloísa nasceu já lutando pela vida. Suportou, ainda no ventre, a viagem de emergência nos mais de 130 quilômetros que separam Bonito, no Agreste, e o Recife. A esperança era que na Capital conseguissem mantê-la na barriga da mãe até que ela estivesse realmente pronta para vir ao mundo. Ganhou apenas mais uma semana. Chegou a 1,2 quilo e completou sete meses gestacionais. Ainda não era o ideal, mas foi impossível esperar mais. A batalha da bebê já dura mais de um mês no Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e ainda não tem data para acabar.

A guerra pela sobrevivência à prematuridade de Eloísa se soma a de outros cerca de 20 bebês também atendidos na neonatologia do hospital e multiplica-se quando olhamos para todo o Estado. Em média, são 16,2 mil nascimentos prematuros por ano em Pernambuco, o que representa 11,2% de todos os partos. São quase 45 bebês nascendo, diariamente, antes das 37 semanas de gestação. O cenário local repete a media nacional. Retrato que preocupa organismos internacionais, uma vez que o Brasil aparece em 10º lugar no ranking mundial da prematuridade. A conscientização sobre desafios da prematuridade foi celebrada internacionalmente na última sexta-feira.

A história de Eloísa caminha junto à de Eloá Vitória, que está no leito da sala do lado. Outra pequena guerreira que veio ao mundo com apenas 29 semanas gestacionais. Tinha apenas seis meses. Também enfrentou a estrada do Interior até o Recife. Deixou Frei Miguelinho, no Agreste, na barriga da mãe, que começava uma jornada difícil e sofrida para salvá-la e que já dura quase 20 dias. Nasceu com 900 gramas, peso que a colocava entre os bebês com maior risco de morte. Vem desafiando a lógica e mostrando que a força da natureza, aliada a cuidados médicos intensivos e à perseverança materna, devem vencer outra vez. Pequenos milagres.

Estatísticas do Ministério da Saúde apontam que 60% dos casos de mortalidade infantil se concentra no período neonatal, que vai de 0 a 28 dias após o nascimento, e que a maioria dos óbitos está relacionada à prematuridade. Mães de UTI, Ana Karla da Silva, 27, e Maria Jacqueline Pereira, 22, viram o sonho da maternidade se transformar em pesadelo: a espera pela vida se tornar medo da morte. E a rotina habitual de choros e mamadas darem lugar a sondas e muitos bips dos aparelhos de monitoramento.

“Meu coração foi parar nos pés quando o médico me disse que minha gravidez não ia durar até o final. Eu ainda ia fazer sete meses. Só pensei no pior: ia perder minha filha”, desabafou Ana Karla sobre o dia do nascimento de Eloá. Hipertensa desde a infância, a dona de casa teve uma piora quando engravidou. Controlou o problema com remédios, fez cinco consultas de pré-natal, mas tinha picos expressivos. Ao olhar de relance a menina na sala de parto, toda enrolada em um lençol, não teve a dimensão do quadro. Na primeira visita na UTI, o choque. “Pensei que ela não iria sobreviver. Foi uma das piores sensações que já tive na vida”, lembrou. Mãe e filha já enfrentaram infecção, anemia e taquicardia provocadas pela imaturidade do organismo da pequena. Sem previsão de alta, a contagem atual não é tanto para deixar o hospital, mas conseguir amamentar a menina. Até hoje, Eloá só se alimenta por sonda. 

A amamentação também é o desejo mais palpável de Maria Jacqueline. “Por enquanto ela não pode mamar porque vai gastar muita energia. Mas só faltam alguns dias”, comemora a mãe. A criança passou da fase crítica, mas ainda exige cuidados especiais. Por isso, nada de fixar data para conhecer o quarto de casa e a família toda. O parto com 31 semanas de gravidez aconteceu de urgência porque Maria Jaqueline teve uma grave infecção urinária. “Já tinha ouvido falar de prematuridade, mas na minha cabeça seria tudo tranquilo e já tinha até marcado um ensaio fotográfico”, contou. O baque emocional veio de uma vez. “Passei dois dias para vê-la. Procurei nem ficar sabendo de tudo que estava acontecendo com ela porque me sentia muito mal. A pior parte foi ver minha filha entubada. Depois, ver na enfermaria todas as mulheres com seus bebês, sendo que eu não estava com a minha”, emocionou-se. Para ela, sobreviver a dias tão difíceis só é possível com a troca de experiência e de afetos. 

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