No limite da repressão - Carlos Brickmann

Antônio Assis
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Não, não vamos discutir a decisão da Justiça Federal que determinou a quebra do sigilo telefônico do repórter Allan de Abreu e do Diário da Região, de São José do Rio Preto. Este colunista acha que é uma decisão equivocada, mas certamente os magistrados entendem melhor a lei. Resta apenas torcer para que a decisão seja derrubada na instância superior.

Lembremos o caso: o objetivo da quebra dos sigilos é identificar as fontes de Allan de Abreu para suas reportagens sobre a Operação Tamburutaca, executada pela Polícia Federal em 2011. O Ministério Público pediu ao repórter que revelasse a fonte, o que lhe foi negado, e pediu à Justiça que abrisse inquérito contra ele, quebrando não apenas o sigilo de seus telefones como também o dos telefones do jornal.

A questão é outra: quem é que se beneficia do segredo da fonte, que até agora ninguém ousou exigir de um jornalista? Não é o jornalista: na verdade, é o leitor. É o público que necessita da informação. E o jornalista, como intermediário entre a fonte de informação e os que dela necessitam, se utiliza da liberdade que o público tem, para ser informado, e vai buscar a notícia onde ela estiver. Violar os sigilos do jornalista, em último caso, significa dificultar o acesso da população em geral às informações que ele poderia obter.

A fonte passa a informação ao jornalista confiando que não será exposta. O jornalista garante à fonte que, conforme reza a lei, não é obrigado a expô-la. Aceitos esses princípios, informações de interesse público são fornecidas ao jornalista, que as repassa à população. O jornalista pode ser processado, pode ser condenado, se não conseguir comprovar o que publicou; mas até agora sua fonte estava a salvo da curiosidade dos outros.

Caso não haja rápida modificação da sentença em instância superior, é muito provável que a fonte do repórter Allan de Abreu seja encontrada e esteja sujeita a sofrer perseguição das pessoas, possivelmente poderosas, afetadas por suas revelações. Isso a curto prazo; a médio prazo, quem se sentirá seguro para transmitir à imprensa e à opinião pública informações de que seja detentor, por mais importantes que sejam? 

Carl Bernstein e Bob Woodward são excelentes repórteres, mas sem o sigilo da fonte seu principal informante, Deep Throat, provavelmente nem teria entrado em contato com eles. E o caso Watergate, se desvendado fosse, levaria muito mais tempo - tempo suficiente, talvez, para que o presidente Richard Nixon terminasse seu segundo mandato e qualquer revelação que pudesse prejudicá-lo já tivesse perdido a eficácia. 

Vale a pena lembrar que a inviolabilidade do sigilo da fonte foi assegurada até pela Lei de Imprensa editada nos tempos da ditadura militar. Ambas, a Lei de Imprensa e a ditadura, não ficaram famosas por posições favoráveis à liberdade de informação e expressão. E mesmo assim foram mais liberais do que a decisão que agora foi tomada.

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