Estudantes da UFPE desenvolvem aplicativo para denunciar casos de abuso em ônibus

Antônio Assis
4 minute read
0
Adaíra Sene
Diário de Pernambuco

A média brasileira de assédios sofridos por mulheres em espaços públicos é de, assustadores, 86%. O número foi divulgado em um levantamento feito pelo Instituto YouGov, que considera assédio atos indesejados, ameaçadores e agressivos, incluindo abuso verbal, físico, sexual ou emocional. Na mesma pesquisa, as mulheres ouvidas não hesitaram ao dizer que temem andar no transporte público por conta da ameaça constante, a resposta foi dada por 68% das entrevistadas quando questionadas sobre situações em que mais sentem medo. Para tentar reverter essas estatísticas no país em que uma mulher é estuprada a cada 11 minutos, duas estudantes da Universidade Federal de Pernambuco desenvolveram uma plataforma digital que, atuando em rede, pode salvar vidas. O N!NA é um aplicativo que emite alerta informando a localização, o horário, a linha do ônibus e qual o tipo de violência que a usuária está sofrendo no transporte público. A ferramenta foi selecionada pelo programa de inovação social da Red Bull Amaphiko e será lançada, no próximo dia 9, às 16h, no anfiteatro do Centro de Informática (CIn).

Para se cadastrar, usuária só precisa logar com a conta do Facebook. 
Foto: Natália Di Lorenzo/Divulgação

Devido ao alto índice de violência contra a mulher e a dificuldade de prevenção e coerção por parte das autoridades, o dispositivo foi criado. "Minha mãe foi cobradora de ônibus e, durante a minha infância e adolescência, sempre a via saindo às 4h para trabalhar e ficava apreensiva. Meu vizinho também era cobrador de ônibus e, durante um assalto, ele levou um tiro e ficou de cadeira de rodas. Todo o medo que eu tinha ficou mais intenso. Na minha família, muita gente trabalha em transporte público, tenho tio taxista, prima maquinista e o tema mobilidade sempre foi presente. Meu primeiro estágio foi em uma empresa de ônibus, eu sabia de todas as denúncias e sabia, também, que elas não viravam nada, nem mesmo uma planilha no Excel. Me sentia impotente, mas precisava fazer alguma coisa", contou uma das desenvolvedoras do projeto, a estudante de publicidade e propaganda Simony César, de 25 anos.

Ao lado da estudante de engenharia da computação Lhaís Rodrigues, 23, ela criou o N!NA. "Ano passado, aconteceu um hackathon no Porto Digital. Nosso desafio era usar dados livres para solucionar problemas da cidade. A ideia do N!NA era construir uma espécie de sororidade tecnológica. Ele funciona como os apitos funcionam em comunidades. Quando as mulheres estão em perigo, elas assopram e chamam a atenção para que as pessoas possam ajudá-las. Meu ambiente é muito machista, mas ganhamos. ", detalhou Simony.

No dispositivo, quando a usuária faz a denúncia, outras pessoas em um raio próximo e nas paradas de ônibus que estão em menor distância recebem uma notificação no celular. O aplicativo cria um mapa informativo e permite acompanhar os casos de abuso contra a mulher. 

Para utilizá-lo, basta fazer o login com uma conta válida do Facebook. A versão beta, de teste, será lançada para alunas dos diversos centros acadêmicos do campus Recife da UFPE. Atualmente, 119 estudantes já se cadastraram, mas as organizadoras pedem que outras interessadas façam o cadastro. "Quanto mais gente se inscrever melhor o programa vai funcionar", explicou. A expectativa é de que o N!NA seja lançado, oficialmente, no primeiro semestre de 2018. Enquanto isso, Simony César e Lhaís Rodriques estudam parcerias com outros aplicativos relativos à mobilidade. "Na verdade, temos um API e queremos expandir nossa ideia para todos os modais. É possível instalar um botão do N!NA em outros aplicativos e possibilitar que as usuárias façam a denúncia", continuou.

Clique para se cadastrar (somente estudantes da UFPE)

SORORIDADE TAMBÉM NO FINANCIAMENTO
Para a ação ser disseminada e aperfeiçoada, no entanto, as estudantes precisam de ajuda da população. O aplicativo foi todo desenvolvido a custos próprios. "A Red Bull financia a demanda de sistema nos oferecendo escritório e mentoria. Mas, a partir do dia 13, vamos lançar um crowdfunding (financiamento coletivo) para poder arcar com as despesas do aplicativo e conseguir mantê-lo em funcionamento. Nessa hora, é muito importante a participação de todos", lembrou a desenvolvedora. 

N!NA
O nome do aplicativo é uma homenagem à cantora e compositora americana Nina Simone (1933-2003), ícone de luta e resistência feminina. Saiba mais sobre o aplicativo através da página Nina no Facebook (clique).