Luiz filipe Freire
Folha-PE
O metrô como saída para o problema da mobilidade na Região Metropolitana do Recife (RMR). Pequenas unidades prisionais em vez de complexos, como o do Curado, construídas em regime de Parceria Público-Privada (PPP). Essas são algumas propostas defendidas pelo engenheiro civil Stenio Cuentro, com passagem por diversos órgãos públicos, entre eles, a diretoria de engenharia de tráfego do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PE). Hoje, o especialista assume a presidência da Associação Brasileira de Engenheiros Civis de Pernambuco (Abenc-PE) com o compromisso de ampliar a discussão sobre esses temas junto ao Estado e à sociedade. À Folha de Pernambuco, Cuentro destacou a necessidade de buscar soluções exitosas fora das nossas fronteiras e ressaltou as propostas de elaboração de um plano estadual de habitação popular e de implantação de uma câmara permanente de meio ambiente, com uma missão desafiadora: o plantio de um milhão de árvores em Pernambuco em três anos.
Como os engenheiros civis podem contribuir, enquanto associação, para a superação dos desafios de Pernambuco?
É preciso discutir. Se há outras experiências em outros estados, vamos ver. Se há experiências no exterior, vamos ver. Porque o problema de mobilidade é problema aqui. Lá fora, já foi resolvido. Habitação é problema aqui. Lá fora, já foi resolvido. Tem que buscar o que funcionou, senão você se tranca. É isso que estamos nos propondo a fazer. Estamos nos propondo a ser um fórum de discussão dessas políticas. Isso faz parte da nossa profissão. O engenheiro planeja, executa, tem uma boa formação. Essa é nossa proposta: discutir esses temas de uma forma bem abrangente.
A falta de mobilidade é um tema recorrente nas grandes cidades e, no Grande Recife, esbarra em projetos inacabados, como o BRT. Como superar isso e avançar?
Temos a faixa exclusiva de ônibus e as ciclovias que vêm sendo implantadas e são coisas muito boas, mas que estão restritas ao Recife. Nos outros municípios da Região Metropolitana, pouco foi feito em relação a isso. Ainda assim, esses serviços são soluções de curto prazo para você aliviar um pouco a imobilidade. Na realidade, a solução para a mobilidade, isso no mundo todo, é o transporte de massa, o metrô. Não tem nenhuma novidade nisso, em defender a extensão do metrô para a Região Metropolitana toda. O que a gente vê é que o sistema de transporte metropolitano foi planejado há 30 anos. Ele ainda nem foi todo implantado e já está superado há muito tempo. E o metrô não tem tido prioridade.
Mas essa expansão tem como entrave o custo, que é alto...
Gastou-se R$ 2 bilhões no BRT (Bus Rapid Transit) e não tem BRT totalmente implantado. Com R$ 2 bilhões você, provavelmente, teria construído entre cinco e dez quilômetros de metrô na Região Metropolitana. Principalmente na área mais complicada, onde o ônibus circula, a área mais central. E já há estudos nesse sentido. A gente tem que notar que o valor que hoje se investe em ônibus é uma solução que é desaprovada pela população. Com esse investimento, você já teria outra linha de metrô para a Zona Norte (do Recife), para a região de Olinda, Paulista. Metrô é uma coisa que todo dia você tem que fazer um pedaço. Isso acontece em Tóquio, Londres, Nova York. O ônibus é que tem que complementar o metrô, e não o contrário. A bicicleta complementa o ônibus, e o pedestre, a bicicleta. Só que aqui a hierarquia está invertida.
Chama atenção a proposta de participação num plano de reestruturação do sistema prisional do Estado. O senhor defende a construção de pequenas unidades prisionais em vez de complexos. Qual é o problema dos complexos?
Essa história de complexo só tem aqui. Você claramente nota que os complexos não funcionaram aqui na Região Metropolitana. O Complexo do Curado não funcionou, não ressocializou. O Complexo de Itamaracá também não funcionou. O Governo disse já: Não tenho dinheiro. Então, como é que vai ser? Nos Estados Unidos, há uma prática de que a iniciativa privada constrói pequenas penitenciárias para abrigar 200 presos, para abrigar cem presos. É um negócio nos Estados Unidos. Então, por que a gente não vai lá e verifica como isso está funcionando? Será que é o tamanho do negócio? Será que é o modelo de gestão do negócio? Eles têm 2,5 milhões de presos, a segunda maior população carcerária do mundo. O Brasil deve ter hoje em torno de 650 mil presos. Quando falo em PPP para presídio, é um modelo que funciona nos Estados Unidos.
Mas estamos tendo uma experiência traumática com a de Itaquitinga...
Aquela é uma PPP que não funcionou. Nós temos algumas de sucesso. Temos a Ponte do Paiva. Estamos tendo a participação da empresa privada na implantação de um sistema de esgotamento sanitário, e até agora o processo vem andando. Talvez não na velocidade que a gente gostaria, mas está andando. A de Itaquitinga não funcionou por quê? Porque fizeram um empreendimento muito grande de uma só vez. Se ele fosse fatiado em sete unidades, primeiro tivesse sido feito uma unidade, depois outra unidade, depois outra, seria possível ir implantando e desafogando o sistema. Acho que a ideia de complexo, aparentemente, não funciona, porque concentra muitos presos e gera o problema que a gente está vendo aí. Duas fugas em menos de uma semana. Já as pequenas instalações, com menos vagas, não geram impacto na vizinhança. O juiz está perto, em cada comarca você tem um juiz. Ou seja, tem muita coisa para ser discutida e estamos nos propondo a isso. O que não pode é ficar como o Curado, com milhares de presos dentro de um bairro em que o vizinho mora a dez metros de distância do muro do presídio
Sobre habitação, que contribuição pode ser dada para a elaboração de um plano estadual?
Tem que haver uma mudança nessa lógica de hoje. A habitação não pode ser tratada como uma doença, que a cada dez anos aparece um governo que quer fazer 50 mil casas, 100 mil casas. A habitação é um problema que o Estado tem que intervir todo dia e o dia todo. E plano habitacional é isso. Não só são grandes conjuntos habitacionais. Você tem os vazios urbanos em toda a Região Metropolitana. Você encontra terrenos de 20 por 20, que você pode colocar 16 habitações ali. Você não tem que fazer cinco mil habitações e esperar oito anos para construir um empreendimento. A população do Estado de Pernambuco cresce organicamente à razão de 70, 80 mil pessoas por ano. E como resolver esse problema? Onde é que esse pessoal vai morar? Ou seja, tem que ter um programa de habitação. Na nossa concepção, toda semana tinha que estar sendo entregue 50 casas ou 50 apartamentos na Região Metropolitana. Isso tem que fazer parte da rotina da Região Metropolitana, da rotina do Estado, e não como um grande evento midiático.
Outra proposta é discutir a reutilização da água. De que forma isso poderia vir à prática?
Tem um grande shopping center na cidade do Recife que, sozinho, por mês, consome 30 milhões de litros de água. Só para ter uma ideia, dá para abastecer uma cidade, talvez, de 50 mil habitantes. Aí você pergunta: esse empreendimento reusa água? O grande consumo, às vezes, é no sistema de ar condicionado. Depois disso, a água é jogada fora. Essa água poderia ser usada nos banheiros, na limpeza, nas bacias de descarga, nos mictórios... Em Israel, por exemplo, você reusa a mesma água 11 vezes. Então, para começar, nos projetos de médio e grande porte, aqui, você primaria pelo reuso da água para poder licenciar. É o que pretendemos discutir. Obrigar o reuso da água é uma solução ambientalmente correta e economicamente mais barata. Recentemente tivemos cortes no abastecimento por falta de água na Região Metropolitana. E, mesmo assim, você hoje toma banho e aquela água do banho é jogada diretamente na rede de esgoto. Isso tem que mudar. A gente quer estimular essa prática. Tem que virar consciência e obrigação.
E o desafio de plantar um milhão de árvores em três anos em Pernambuco?
Essa é uma contribuição não do engenheiro, mas do cidadão que se formou engenheiro. Não que a gente vá sair carregando um milhão de árvores nas costas, mas a gente se articula com os órgãos e as entidades e promove essa ação de uma forma coordenada. A gente quer transformar a Semana do Meio Ambiente no Ano do Meio Ambiente. Vamos distribuir mudas de árvores para as pessoas fazerem sua parte. Vamos orientar para que plantem, fotografem a árvore e mandem para a gente pelo WhatsApp onde está plantada e como estão cuidando dela. O meio ambiente é responsabilidade de todo mundo.