Wilson Maranhão
Folha-PE
Diante do surto de dengue, chikungunya e zika vírus, a gestão pública é cobrada por ações de combate ao mosquito Aedes aegypti. Na mídia, campanhas alertam sobre o dever de casa: deixar o ambiente limpo e evitar água parada. Mas será que a população está fazendo a sua parte? A Folha percorreu os municípios de Recife, Olinda e Jaboatão e constatou que, em muitos locais, em especial, na periferia, há lixo descartado sem o menor cuidado nas ruas. Mais grave: há pessoas acumulando lixo. A maioria catadores. A atitude de recolher o lixo das ruas é importante. Mas a forma de armazenar está errada, já que contribui para a proliferação do mosquito.
Acúmulo de lixo facilita proliferação do Aedes aegypti no Grande Recife
O reciclador José Everaldo, 49 anos, reconhece. “É, infelizmente acabo sendo o vilão. Preciso ter cuidado”, disse”. Há três anos ele mantém uma montanha de entulhos, entre pneus, madeira, móveis e eletrodomésticos em frente à sua residência, na Praia dos Milagres, em Olinda. “Não faço ideia da quantidade de lixo que eu junto. Quando chove dou uma olhada para ver se acumulou água. Mas até a chikungunya eu peguei. O que posso fazer se esse é meu ganha pão?”, disse.
Quem mora ali perto é a dona de casa Luciana Bezerra da Silva, 31, junto com o marido e os dois filhos. Os quatro estão com chikungunya e acreditam que a proliferação do vetor vem dos entulhos que se acumulam na vizinhança.
“Estamos todos doentes. Meus filhos, de 1 e 3 anos, não escaparam. Estão com os dedos inchados e dores nas pernas. O pior é que eu não vejo nenhum agente passando aqui para colocar larvicida nos depósitos”, lamentou Luciana. No Recife, moradores de um beco às margens do canal do Arruda, próximo ao cruzamento da rua Petronila Botelho com a avenida Professor José dos Anjos, convivem diariamente com um paredão de lixo de quase 3 metros de altura. Uma vizinha que mora em em frente ao entulho relata que todo o acumulado é de responsabilidade de uma moradora vizinha, que é catadora.
Segundo a dona de casa, a vizinha teria desistido há alguns meses de vender reciclados, mas não se livrou de tamanha sujeira. “É um absurdo. Alguns vizinhos já denunciaram a situação à prefeitura. Até vieram aqui, tiraram fotos, mas nada foi resolvido”, comentou a mulher que não quis se identificar.
Em Jaboatão, em Porta Larga, a situação do acúmulo de lixo não é diferente. E lá, muita gente também anda adoecendo por conta da proliferação do Aedes. Em uma semana, três pessoas da família de Maria José Nascimento, 61, contraíram viroses transmitidas pelo mosquito. Seu neto de 10 anos teve zika. Ficou bom da virose, mas teve complicações neurológicas. Ficou sem conseguir andar. Foi diagnosticado com a síndrome de Guillain-Barré e está internado no Hospital da Restauração.
Seu vizinho do lado, o catador Edilson Paulo Vilela, 65, iniciou a venda de resíduos no início de 2015. No entanto, desistiu da prática e ainda não se livrou do lixo acumulado. “Comecei a juntar o lixo para vender. Mas esse negócio não dá dinheiro. Então, desisti”, disse Vilela, que acumula móveis, madeira e eletrodomésticos na frente de casa.
Punições
Recife, Olinda e Jaboatão têm leis que pune o descarte irregular de resíduos e entulhos em vias públicas. No entanto, nenhuma das legislações das três cidades enquadra punições para os acumuladores de lixo. Apenas Olinda e Jaboatão sinalizaram que em alguns casos ainda cabe uma análise para sanções administrativas.
“Apesar de não haver ainda esse entendimento em nossa lei, se a nossa equipe de fiscalização detectar irregularidades, em especial, focos do mosquito Aedes aegypti, em espaços de reciclagem recomendamos a retirada dos entulhos em 24 horas. Caso isso não aconteça, o município interdita o local”, informou o secretário de Infraestrutura de Jaboatão, Marconi Madruga.
No Recife, segundo a Emlurb, entre os meses de janeiro a novembro de 2015 foram aplicadas 3.198 multas por descarte irregular de lixo. As infrações mais registradas pelo município são: descarte irregular de metralha e restos de poda, colocação de lixo em local indevido e panfletagem. A Emlurb informou que remove diariamente cerca de 3 mil toneladas de resíduos, sendo 39% descartada irregularmente. São gastos mensalmente cerca de R$ 2,4 milhões no trabalho de remoção de resíduos depositados em locais inapropriados.
Em relação às situações denunciadas pela Folha, a Emlurb informou que enviará uma equipe para avaliar o depósito a céu aberto no bairro da Arruda. Em Jaboatão e em Olinda, ambas as gestões também ficaram de enviar equipes para verificar o acúmulo indevido de lixo e “tomar as providências cabíveis”.