Da embolada ao frevo: por que a cultura pernambucana depende da rua

Antônio Assis
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Foto: Rafael Martins/Esp.DP/D.A.Press

Luiza Maia - Larissa Lins - Fellipe Torres
Diário de Pernambuco

O pernambucano não se espanta quando é surpreendido por uma dupla de repentistas com viola nas mãos. Ou quando testemunha uma performance circense sobre a faixa de pedestres. Ou quando se depara com um cortejo de maracatu, mesmo fora do período carnavalesco. É arte de rua, faz parte da paisagem. A dificuldade em apontar a gênese da cultura popular no estado indica, justamente, a presença atemporal das manifestações. Sempre esteve ali, pelas esquinas. “A cultura popular é praticamente desenvolvida a partir da integração na rua. Os desfiles são o coroamento e a vivência disso. A gente não teria em Pernambuco o que tem hoje se não houvesse essa integração e troca entre as pessoas”, crava a historiadora e pesquisadora Sylvia Couceiro, da Fundação Joaquim Nabuco.
A ligação indissociável foi confrontada pela Lei 15.516, em vigor desde o dia 27 de maio, que pôs a classe artística em estado de efervescência. A imposição de regras, como a ausência de menores de 14 anos, isenção de patrocínio privado para as performances e - ponto central das polêmicas - limitação de horário entre as 10h e as 22h, feriu a essência da arte de rua, a liberdade expressiva e suscitou debate. Desde a sanção, protestos foram realizados e notas de repúdio publicadas. 

“As manifestações culturais pernambucanas surgem nas ruas porque os clubes eram fechados. O povo não tinha lugar para brincar. A rua é o único lugar para se mostrar, até porque casa de pobre é pequena”, explica o historiador Severino Vicente, professor da UFPE.

Foi nas ruas que a religiosidade africana inspirou o cortejo dos maracatus, o culto à jurema conduziu os caboclos em desfiles, sambadas de coco ecoaram por madrugadas e a festa de Reis portuguesa ganhou contornos tropicais. “É nos locais abertos que soam as violas, que ocorrem as cantorias, as emboladas, os encontros de cordéis. A qualquer hora”, frisa o poeta popular Sennor Ramos. A onipresença da arte, gratuita e democrática nas ruas, perpetua o folclore local. Os poetas urbanos, na história da arte ao redor do mundo, dependem delas.

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