Comoção no país foi grande após a morte de Tancredo. Os brasileiros foram às ruas para se despedir do político. Foto: Adauto Cruz/CB/D.A Press
Estado de Minas

Uma empreitada nada fácil. Até hoje foram frustradas as tentativas de acesso, inclusive da família de Tancredo, aos documentos.
Agonia
A agonia de Tancredo se iniciou na noite de 14 de março de 1985, véspera de sua posse na Presidência da República. Ele sentia fortes dores abdominais, não constatadas em exame de rotina feito um dia antes pelo clínico Renault Ribeiro e o cirurgião Francisco Pinheiro Rocha. Já no Hospital de Base de Brasília, após novos exames e com o hemograma à mão, Rocha comunicou à família que era necessário operar o presidente imediatamente.
Insistindo no diagnóstico de apendicite supurada, os médicos convenceram a família que a cirurgia e a recuperação seriam rápidas e, em 24 horas, ele estaria em condições físicas de tomar posse. “O que nos foi informado, o clima, era da urgência de realização de uma cirurgia que seria simples”, conta Aécio Neves, neto e secretário particular de Tancredo.
Em meio a confusões, houve desencontros e disputas dentro da equipe médica. Na antessala do centro cirúrgico, uma plateia de parlamentares-médicos e ministros de Estado nomeados aguardava. “A certa altura, houve a possibilidade de invasão da sala de cirurgia até por médicos do próprio Hospital de Base. Era impossível impedir a entrada das pessoas. Entre médicos e não médicos, chegaram a circular dentro da sala de cirurgia cerca de 60 pessoas”, descreve o pesquisador.
Quando no dia 15 de março os médicos abriram o peritônio de Tancredo Neves, não acharam um “apêndice supurado” indicado pelo diagnóstico inicial. “Não havia infecção, nem risco de morte”, diz o pesquisador Luis Mir. Diferentemente, foi encontrado um leiomioma infectado, que não representava risco de morte.
Apesar disso, Francisco Rocha, que conduziu a operação, manteve o curso do procedimento cirúrgico adequado para divertículo. O tumor que o cirurgião acreditou ser “divertículo” foi removido com uma técnica considerada inadequada para o leiomioma. “Quando utilizada nesses casos, é grande a probabilidade de o paciente sangrar. Foi o que aconteceu”, explica Mir. A sutura malfeita viria a provocar sangramento desde o primeiro momento.
Outros procedimentos também prejudicaram o paciente. Segundo Mir, a anestesia foi programada para um tempo de operação curto. Só que se prolongou e foi necessária mais anestesia. “Com a retirada abrupta da ventilação mecânica, o pulmão do presidente foi encharcado por excesso de líquidos, provocando uma atelectasia (colapso de parte ou de todo o pulmão)”. Os danos evoluiriam para o quadro irreversível de pulmão de choque, o que leva à parada do coração.
Em 20 de março, a segunda cirurgia. Nela já estava presente Walter Pinotti, do Instituto do Coração (Incor). “Foi uma laparotomia branca, com o diagnóstico equivocado de obstrução do intestino. Ao mesmo tempo, o sangramento da sutura da primeira operação acabaria em hemorragia catastrófica”, diz Mir.
Em 25 de março, o presidente teve uma nova hemorragia, desta vez maciça. “Ele evacuou cerca de 3 litros de sangue vivo em menos de 12 horas”, conta Mir. Em 12 de abril, o primeiro presidente civil pós ditadura militar foi sedado definitivamente e se tornou um paciente terminal. Nove dias depois, o assessor de imprensa, Antonio Britto, anunciou ao país a morte de Tancredo.