Espaços como o da Praça do Carmo, em Olinda, são usados como dormitório
Marcílio Albuquerque
Folha-PE

“Lembro que a gente vinha pra cá com o propósito de paquerar as moças. Eu vestia a melhor roupa, passava um bom perfume e encontrava a casa cheia. Era uma brincadeira saudável que já não existe mais”, recorda o aposentado Alcides Ribeiro, de 90 anos. Morador de Olinda, desde garoto, ele parece abrir um baú de memórias ao falar do único coreto do lugar, instalado no largo do Carmo, bem aos pés do majestoso templo católico. “No domingo à tarde havia a retreta, com a banda dos militares ecoando e todos acompanhando ao redor. Eram boas risadas garantidas e assuntos que não tinham fim”, complementa.
A composição tem parte do gradil riscado e muito entulho no interior. O problema também é social e, apesar do dia já claro, quem passou a noite por ali ainda não encontrava motivos para levantar. Perto da avenida Agamenon Magalhães, um dos mais importantes corredores viários da Capital, a Praça do Derby ainda abriga um coreto. Apesar do bom estado, ele passa despercebido pelo expressivo número de trabalhadores e estudantes que trafegam ao seu redor. O jardim ao seu lado tem assinatura famosa. Projetado pelo paisagista Roberto Burle Marx, recebeu o status de patrimônio nacional. “Seria tão legal se houvesse alguém por aqui para contar as suas origens ou, ao menos, uma placa de sinalização”, diz a recepcionista Helena Gomes, enquanto aproveita o horário do almoço para descansar.
No encontro das ruas da Concórdia e Imperial, o coreto da praça Sérgio Loreto se integrou à paisagem do bairro de São José. Ele já foi branco, amarelo e agora exibe um alegre tom laranja. Por lá, nem mesmo o imponente galo esculpido em bronze, marco do carnaval pernambucano, conseguiu escapar da ação dos vândalos. Ele perdeu parte da cauda e uma das asas. No chão, papelões e muita sujeira dão indícios da sua atual utilização. “Isso aqui virou ponto de consumo de drogas”, revela um auxiliar de depósito que, por medo, prefere não se identificar.
Um clima bucólico ainda impera na praça Fernando Figueira, na Ilha do Leite, região conhecida por abrigar um requisitado polo médico. No espaço público, que antes trazia o nome do expressivo poeta espanhol Miguel de Cervantes, também pode ser encontrado mais um coreto recifense. A estrutura lateral em madeira está nova e ainda reluz seu traçado em verniz. A aparência convidativa, na verdade, é fruto dos cuidados prestados pela iniciativa privada, situação flagrada durante a reportagem.
Passando para a vizinha Jaboatão dos Guararapes, dois exemplares também podem ser vistos. Um deles fica logo no centro, na arborizada praça Dantas Barreto. O lugar é caminho de muitos, fruto de sua proximidade com a estação do metrô e um concorrido posto de recrutamento profissional. O segundo ponto está bem mais adiante, no bairro do Socorro, na praça Marechal Floriano Peixoto. A reclamação dos moradores, dessa vez, diz respeito à violência. Já que o local, que tinha essência de festa, também foi cenário de ações criminosas. Apesar de se localizar bem diante de um amplo quartel general, responsável por sua manutenção, o clima é de medo.